quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Tarô

Caminhava sozinha na madrugada do primeiro dia de 2008 quando pisou em um pedaço sujo de papel, lado inverso de um desses panfletos pregados nos postes da cidade. Panfleto esse insistente, já que não desgrudava da sola de seu pé descalço. Na calçada sentou-se e tomou aquele insignificante pedaço de papel para si - costuma encaixotar momentos. Da bolsa tirou a caneta do ano passado, e tentou escrever sentimentos, imagens.
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"Fogos explodem no manto negro do céu, em uma constelação de estrelas. Enchem minha face pálida e minha alma descolorida de alegria. A multidão pula, dança e canta. O branco impera. Risos escandalosos e palavras cordiais são a trilha sonora que pode ser ouvida daqui, da beira da estrada.
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Ela, aquela mesma de todos os anos novos e velhos, fecha os olhos e beija a palma das mãos com o zêlo e o carinho de quem tem muito amor para dar. Então promete para si mesma: 'Vou cuidar de você. Ninguém levará pedaços tão bonitos de você novamente, no more souvenirs'.
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Nada mais de conflitos internos, de crises existenciais. Nada mais de wasted tears, wasted years. Nada mais desse corpinho de dezesseis com essa antipatia de setenta e três. Nada mais de procura, de espera, de stalking.
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A vida é tão intensa, tão imensa; ora, pare de lamentar. A vida é essa infinita highway. Não é algo que se compre, que se possa barganhar. E finalmente ela percebe: sua procura, por si só, já é o que ela quer encontrar - quando alguém chamar seu nome".
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Guardou a caneta. Ao dobrar o papel notou no canto direito da propaganda de um tarô, letras grandes em tom de lilás: "O destino está à espera!". Sorriu um daqueles sorrisos incrédulos e calçou suas havaianas anatômicas. Nada mais cruzou seu caminho desde então.
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Quanto ao futuro, não façamos reservas.

2 comentários:

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Parece que você voltou à ativa.
Esses papéis de tarô não são uma boa.
Depois que eu joguei um no lixo e minha casa quase pegou fogo, eu percebi que não se deve brincar com eles. Desde então eu apenas os recuso quando me entregam.
Talvez seja porque tenho um complexo de Murphy, não necessariamente por causa do papel.
Idiotíces a parte, continue com o excelente trabalho. Teus textos transpiram inspiração (trocadilho interessante) e teu português me dá inveja. Se tivéssemos 100 pessoas nesse país que escrevessem como você, estaríamos muito bem.
É isso por hoje.
Beijos!